Um carta.

         
Rio de Janeiro,30 de maio de 2012.
    Se me perguntarem o que aprendi com vocês, não saberei enumerar. Até hoje aprendo. A experiência vivida foi única e essencial em novas caminhadas que se iniciam. Mais calma, menos pressa, mais paciência, mais CUIDADO, tudo que isso tento colocar em prática ainda hoje mesmo que errando as vezes, todo esse aprendizado devo a vocês.

"Como chamar não chamar de "amor" a paixão que ligou artistas de teatro a outros, transformando em prática aqueles que pareciam, aos desapaixonados, frutos da obsessão de maníacos solitários?"(pg.XVI-E.Barba)

       Os risos e as surtações nunca mais serão os mesmos, que os da REKA...junto a Lara e a Rafa, acho que nem o céu era o limite. Aquela com que em uma caminhada comecei a sonhar, sempre será uma parceira de cena, pra compor a cena né Drica. E hoje de uma alegria e fé imensurável aquela que em cena é genial, torna-se uma genial irmã...em busca de sonhos...em busca do desconhecido...em busca de nossa arte...minha Vespa-Kátia.
Mas hoje sem querer abri o blog no trabalho, como que pensando.... ando tão sem pensar em teatro. Mas vi que não, ainda penso.
Será que o caminho mudou, acho que não, o percuso é outro hoje, com outros. Mas com vocês sempre perto.
Dai fiquei pensando, que não sei por que escrevo tanto, sei que tenho que colocar mais prática, mas eu to fazendo....aos poucos....são os novos percusos. Como atriz ainda perdida, mas com a percepção aguçada como encenadora, ao menos atenta a criar.
Em um novo processo.
Sempre estarei por aqui em busca de ver-te e viver-te minha REKA.
Porém a tentativa de escrever sobre teatro, tomará outros espaços o que espero realmente, é que renasçamos em cena. Por que em nossos corações, eu tenho plena certeza, que a REKA vive como nunca.
O deserto mau começou a ser atravessado, mas sei que sempre estarão ali segurando minha mão.

"Eu atravessava o deserto e, sem saber, incorporava a convicção de que o teatro é uma chama que para arder precisa de lenha, o corpo e a alma do ator. Na extensão da areia, eu via inseperadamete o arbusto ardente. Por uma fração de segundos, a chama brotava do ator, uma iluminava uma parte escondida de mim, falava, tornava-se mythos-soma, me sacudia e me guiava por um caminho obscuro, incerto, turvo, segurava minha mão e me ajudava a vencer minhas hesitações e medos."(pg.28.E.Barba)

Que venham os medos, afinal eles nos movem. Aprendi e sempre aprenderei e criarei com vocês mesmo que os espaços mudem e eu me desloque. Uma frase que se resume quando o afeto é verdadeiro.

"O presente é tão grande, não nos afastemos.Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas." Drummond.


Um beijo e aquele abraço pra REKA.



Saudades, com amor e carinho....

Lili.



Composição transitória de um refletir ... sobre o efêmero.

De uns dias pra cá comecei a perceber o efêmero do teatro, não que antes não o sentisse. Mas quando falo perceber, na verdade eu o sinto mais....isso deve ser consequência do tempo que me parece acelerar. 
No teatro, arte coletiva onde o ser humano é o centro de criação e de pesquisa, não se trata de fugir, de negar mas de compreender essa arte como efêmera e a força que isso tem sobre a criação de uma obra de arte, ou seja o espetáculo.
 Dadá essa percepção que se aflora nos meus sentidos teatrais, começo a me questionar. Como é complexo estar na cena, quanto grande é dimensão de se comunicar através do efêmero, melhor dizendo no efêmero. Fazendo analogia há algumas leituras feitas recentemente acredito que se trata de ir a fundo, de ver a extensão de levar ao público a realização do teatro, é incrivelmente incendiário a qualquer artista que cria, a partir de gestos, memórias, contos e obras literárias. Nesse parametro o teatro não teria tempos seria feito de tempos heterogênos, realizado no tempo presente, no instante da cena.
[...]A essência do teatro está contida em algo misterioso chamado "o momento presente"Brook.(pg97)A Porta Aberta.
Sendo essa a essência do teatro, há de concordar que torna-se ainda mais inexplicável a experiência de se compor a cena teatral. Dura só um dia, só um instante, compor a cena trata-se de um momento único de troca de arte, uma arte transitória que não se repetirá. Olhando dessa forma, creiamos que o suporte da arte do ator/atriz é a memória do espectador, pois perante esse a obra de arte se realiza, e é única.
Assim sendo sentir o efêmero pra mim hoje é mudar o olhar, pois se trata ainda mais de um contato direto, de uma experiência de vida, melhor dizendo, teatro hoje torna-se um exercício de vida.
E quem sabe o mais difícil  e prazeroso da efemeridade dessa arte seja deixar de lado aquele "reconhecimento" que nos persegue, e encerrando ainda com muitas perguntas e pensamentos do mesmo. Faço uso dos grandes mestres e aprendo.

"O senhor escreveu dizendo que desejaria ver os resultados concretos do seu trabalho. Pois bem, permita-me que lhe diga:resultados concretos não se vêm nunca. Os resultados concretos (sobretudo em uma arte fugaz como o teatro) nascem e morrem num abrir e fechar de olhos, e penso que seja errado ligar-se a eles.[...] [A verdade que se tem é somente daquilo]que se fez experiência, sendo assim (no teatro), daquilo que se sabe e que pode ser verificado no próprio organismo, na própria individualidade, concreta e cotidiana".[J. Grotóvski]
Como não chamar de "amor" a paixão que ligou alguns artistas de teatro a outros, transformando em prática aquelas idéias que pareciam, aos desapaixonados, frutos da obsessão de maníacos solitários?

Eugenio Barba
a terra de cinzas e diamanetes.

Quais são as premissas para compor a cena?



"Um acontecimento vivido é finito, ou pelo menos encerrado na esfera do vivido, ao passo que oacontecimento lembrado é sem limites, porque é apenas uma chave para tudo que veio antes depois."W.Beijamin

Hoje temos várias maneiras e possibilidades de pensar e executar o trabalho do ator/atriz. Dentro do panorama histórico que estudamos e conhecemos vários são os teóricos,encenadores, atores que vem ao longo dos anos dissertando e experimentando novas possibilidades, técnicas e métodos para a execução de um melhor espetáculo. Para que possamos compreender e chegar a plenitude dessas fórmulas a de se perceber que isso não é tão simples assim, tem que se ter dedicação, disciplina e a plena consciência de que não se terá fim, que sua formação é contínua. Assim sendo e concordando faço uso das palavras de Peter Brook, Teatro é sobre a vida.”..:o teatro não tem categorias, é sobre a vida. Este é o único ponto de partida, e além dele nada é realmente fundamental. Teatro é vida.”(P.Brook- pg.7)
Sendo assim é infinito, pois não deixamos de viver nunca, apenas quando encontramos com a sorrateira falência total. Logo devemos estar atentos de que por mais que tenhamos vivências e experiências no teatro e na vida, não se trata de estarmos prontos, porém em cada novo processo de criação, estar disposto para aprender e desaprender.
No processo de criação de um espetáculo e no processo criativo em que o ator/atriz mergulha ao começar a ensaiar, proponho uma reflexão fundamentada em duas palavras a experiência e a vivência. Como nos posicionamos quando somos levados a um novo processo perante os demais participantes, independente de seu grau de importância nesse processo. O ato de experimentar, não simplesmente ver se é bom ou ruim, é muito mais submirjo, trata-se de um conhecimento adquirido pela prática da observação ou do exercício. É fazer uma experiência realizar-se. Vinculado a tudo isso está à vivência, tenho de vivenciar essa experiência, abrangendo a vivência como ato de vida, como uma participação passiva, emocional e intelectualmente ativa.
Visualizando os processos de criação já analisados, podemos perceber ainda que se trata de uma entrega e da disponibilidade de quem faz, porém devemos estar atentos não a formulas prontas, mas sim a pesquisa e investigação contínua dessas possíveis “fórmulas” nessa nossa prática façamos uso e levemos para essa pesquisa a proposta dada por Antônio Araújo, no processo de criação do Teatro da Vertigem, onde esse coloca o ator/ atriz como um artista- pesquisador:

Observação Ativa
Abrir-se a percepção dos cinco sentidos;
Dirigir a atenção e o pensamento para o movimento;
Penetrar atentamente nos detalhes;
Descobrir as causas, percebendo o que há por detrás das coisas, a fim de aprender suas possíveis leis(que revelassem uma relação constante ou necessário entre os fatos);
Imparcialidade (o não-julgar previamente, libertando-se de suas ideias preconcebidas, o neutro)
Procurar e/ou estabelecer as relações internas dos fatos;
Dialogar com os fatos;
Usar a máxima suspeita
Usar máxima suspeita sobre si mesmo;

Fazendo uso desses instrumentos dados por Antônio Araújo, do qual o mesmo fez uso em ParaísoPerdido, deve existir o exercício de se perguntar. Aonde queremos chegar? O que queremos comnossa arte? Preparação para o que? Para a formação de um grupo/artista? Para o desenvolvimentoda investigação teatral? Para criação de um espetáculo? Mas de que se trata? O que buscamosquais os resultados que queremos? Como promover ideias pela arte? Devemos definir qual apergunta para a excussão do nosso trabalho e pesquisa.
Trata-se de estarmos dispostos a estar em cena a compor a cena, vivenciando e expêrenciandopara a sua composição real. Nesse usar de métodos e técnicas nos dadas por Stanislávski, Artaud,Grotówski,Eugenio Barga, Peter Brook dentre outros façamos uso para nossa leitura e entrosamentodo que nos traz Matteo Bonfitto que estudou os processos de criação de Peter Brook, afim decompreender como a vida e o teatro podem se fundir através da experiência. Em seus processosPeter Brook, colocava seus atores para improvisar, a partir do “nada” ou de objetos, pois em seuteatro a simplicidade é o que faz a encenação acontecer, não  segredos no teatro, é a vivênciarealizada pelo ator que é para ele um contador de histórias. Sobre o que queremos falar? Sobreque histórias nós falamos?
Vendo no improviso o lugar da pesquisa e da descoberta Bonfitto reafirma através de Brook
...”nesse sentido, as ações surpreendentes, as quais muitos atores considerariam como não relacionadas ao universo da própria personagem, se tornaram, como acontece na vida, a revelação de uma faceta inesperada de uma pessoa. Brook queria que os atores fossem “saturados pelas personagens através da exploração de cenas que não existiam no roteiro.(M. Bonfitto-pg45)

É necessário vivenciar a cena, não apenas ler e falar,  de se viver intensamente essespersonagens tirá-los de nossas vidas, afim de que essas ações sejam reais, e que advenham daimprovisação no processo de criação. É confuso e complicado se pensarmos como essas ideias seorganizam como elas acontecem, porém não é necessário ter-se pressa, é como a formação de umpensamento, assim deve ser a composição da cena, logo de início surgirão duvidas, e isso énecessário, é como aprender a andar, não existe certo e errado, mas tem que se arriscar, assimchegaremos a algum resultado. Há de se aprender a andar todo dia e de várias formas diferentes.Vivenciando a dramaturgia exercendo a mesma em vida e na constituição da cena. Para isso devemos ter a visão atenta ao processos de ensaios, pois é nesse misturar-se de criação que o ator/atriz deverá enxergar. Pois:
O processo de ensaios é como um pêndulo[...] O que importa nos primeiros estágios é a energia, não o resultado[..] Nos primeiros estágios, qualquer coisa pode ser útil: boas ideias necessitam ser despejadas em uma mistura diforme, generosa e enérgica[...]. E então, pouco a pouco a excrescência é jogada fora e as verdadeiras formas, as verdadeiras linhas, que estavam lá, o tempo todo, podem ser descobertas.(M.Bonfitto-pg70)

Nesse processo de ensaio o ator/atriz deve padecer e se destinar ao seu treinamento, énecessário estar atento pois não basta uma, duas, ou dez experiências em cena,  sempre umanova a ser vivida. Nessa perspectiva o ator/ atriz tem de estar com sua observação ativa epercepções acionadas a todo momento, pois nesses período em que a criatividade é estimulada ,ele passa por experiência e coleta de repertório e informação únicas , onde o mesmo passa aconhecer melhor até ele mesmo.

o ator devia investigar a si mesmo: Os atores precisam experienciar um intenso processo de auto-exploração[...] Eles precisam se despir de suas aparentes personalidades, maneirismos, hábitos, vaidades, truquês, clichês[...] para que um estado mais profundo de percepção seja encontrado[...] Nós estamos nos desembaraçando de nossa condição cotidiana[...] mas os atores precisam se transformar antes. Ele precisa se libertar de sua pele inútil como uma cobra. Ele precisa transformar seu inteiro ser. Conhece a ti mesmo.(Bonfitto.pg-47,48)

Estar atendo a vida e vivenciar experiências é de suma importância para o ator/atriz poisele é responsável pelo seu trabalho, e é desse emaranhado e dessa combustão criativa que irá criar. Em outras palavras, o ator é responsável pelos resultados gerados por seu trabalho, ele é responsável pela qualidade produzida em cada momento de sua atuação.(Bonfitto,pg.66)
Essa é nossa principal ação enquanto ator/atriz estar sempre investigando a cena e agregando conhecimento ao nosso árduo exercício de estar em cena, fazendo e reaprendendo a composição da cena, é aquela que imprime uma experiência de vida através da execução do espetáculo. A premissa é de questionar, de nos perguntarmos sempre como compor a cena, vivenciando e experienciando verdadeiramente cada latência que emergir.

Por _ Lili Lucca